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| Cachoeira do Mateus - Foto: Jô Pinto |
Ouvi essa história pela primeira vez,
narrada pelo meu, em um dos muitos momentos que ele reunia, eu e minhas irmãs
para contar causos.
Uma história passada na comunidade da Água
Fria Fábrica, na cidade de Itinga/MG, há
mais de cento e cinquenta anos.
Na comunidade da Água Fria Fábrica, vivia
um homem que se tornaria mito. O vaqueiro, figura rústica e folclórica,
chamava-se Mateus. De rosto marcado pelo sol e mãos calejadas da lida, era
conhecido por sua força bruta, sua rudeza e pela língua afiada que não poupava
insultos nem aos homens, nem às feras.
Numa manhã abafada, Mateus conduzia o
rebanho pelas colinas pedregosas da Água Fria, o som dos chocalhos ecoava pelo
vale, quando de repente um boi se desgarrava da boiada. O animal, de olhar
faiscante e movimentos desordenados, parecia tomado por uma fúria inexplicável.
O vaqueiro, guardião da ordem, não podia permitir a dispersão. Sem pensar duas
vezes, esporeou o cavalo e partiu em disparada atrás do boi rebelde.
O animal corria como se fugisse de forças
invisíveis, ignorando os comandos do vaqueiro, Mateus, tomado pelo nervosismo e
pela ignorância que lhe era costumeira, soltou um brado que ecoou pelas serras:
-
Êta boi desgraçado! Te desconjuro, miserável! Tá com o capeta no couro! Por
onde tu for, eu irei atrás, inté mesmo pras profundezas do inferno, boi do
demônio!”
A perseguição se tornou uma luta de
destino. Homem e animal desciam a serra em fúria, cegos pela disputa, até que o
chão lhes faltou, sem perceber o precipício, ambos se lançaram no vazio. As
pedras e as águas profundas do poço foram as únicas testemunhas da queda, o boi
endiabrado e o vaqueiro de língua solta desapareceram nas profundezas,
engolidos pelo silêncio sombrio.
Nunca mais se viu Mateus. Mas o povo da
Água Fria guarda a crença de que sua alma não encontrou descanso, dizem que até
hoje ele corre atrás do boi nas entranhas do inferno, e que em noites de lua
cheia, quando o vento sopra forte pelas matas, é possível ouvir o canto
distante do vaqueiro ecoando entre as árvores:
-
“Êta boi desgraçado...!”
Assim nasceu a lenda do vaqueiro Mateus,
um homem que desafiou o destino e se perdeu nas águas misteriosas da serra,
tornando-se parte do imaginário popular do município de Itinga.


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