terça-feira, 29 de março de 2022

O ASSUNTO E´? - As veias abertas do Brasil

 

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Desde que o ser humano descobriu que podia retirar minérios do solo e produzir objetos para uso cotidiano, a mineração se fez presente, assim como a metalurgia. Não é por acaso que, os Iorubás,  bem como os gregos antigos, tinham deuses responsáveis pela metalurgia, Ogum e  Hefestos. No entanto, a mineração e a metalurgia em sociedades passadas eram usadas para melhorar a vida humana,   já no capitalismo a exploração da terra é desmesurada, pois visa o lucro e a acumulação desmedidos. A mineração predatória está destruindo o Brasil, parece redundante dizer isso,    já que, desde o início da invasão destas terras pelos brancos europeus, a busca por metais preciosos foi um dos principais objetivos. Atualmente, não apenas os metais preciosos, mas outros minérios largamente utilizados na indústria, são buscados no subsolo do território brasileiro. A atividade é controlada por empresas privadas e é conduzida de forma extremamente nociva ao meio ambiente e às comunidades,  pois não conta com fiscalização e  e controle. Para acessar os minérios é necessário escavar a terra,  assim, a água é contaminada e as matas devastadas, logo, os arranjos produtivos das comunidades tradicionais é afetado. Eduardo Galeano no livro “As veias abertas da América” publicado na década de 1970 e proibido por várias ditaduras do Cone Sul, analisa a histórica espoliação que sofre a América de colonização latina ao longo dos séculos. Interliga passado e presente para abranger uma exploração que nunca se finda, além dos produtos da monocultura agroexportadora,  escoam das veias abertas,  o ouro, a prata e as pedras preciosas que alimentaram o capitalismo nascente, às custas do sangue dos/as africanos/as e dos/as indígenas explorados nas minas mortais, onde a expectativa de vida era curta e se morria de fome ou dos efeitos do mercúrio. Geralmente não se chegava aos 30 anos. Na contemporaneidade, com o desenvolvimento desenfreado deste monstro insaciável que é o capitalismo, mais e mais minérios são necessários para suprir as demandas criadas pelo sistema, que preconiza  o consumo ilimitado e a acumulação dos recursos por poucos. O resultado é o crescimento das áreas de mineração que destroem patrimônios ecológicos, ameaçam terras de comunidades tradicionais e alteram legislações ambientais. Recentemente, tivemos os desastres ligados à mineração com o rompimento de barragens de rejeitos da mineradora Vale   que contaminaram rios e levaram para debaixo da lama centenas de vidas, sonhos e memórias. Esses crimes ambientais seguem sem punição, as ações da empresa só aumentam. Agora, neste momento, uma mineradora vem se instalar aqui na região do Alto Rio Pardo. Anunciam grandes transformações, geração de empregos etc. O que não se evidencia para o povo é que milhares de litros d’água serão usados no processo da exploração e transporte dos minérios, sem falar na contaminação da água. As pessoas são facilmente convencidas por promessas alvissareiras. E assim, lá se vai nossa água, quiçá  nossas vidas, já que ninguém mata a sede com dinheiro.


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quarta-feira, 23 de março de 2022

OPINIÃO DO BLOG - Bahia- Minas Turismo no Vale do Jequitinhonha.

 


Foto: Fernando Mendes


Pensar na retomada da Bahia-Minas soa como um sonho, mas para quem viveu a experiência na linha férrea em Araçuaí ligando os  Vales do Jequitinhonha /do Mucuri até o mar. Pode-se pensar  tratamos de um lugar com um jeito tão especial de ser Minas, e também de  flertar com os sabores, temperos, sons e caminhos até a  Bahia. Permanece, neste caso,  acesa nas memórias e, em narrativas os itinerários, as estações e, sobretudo as facilidades  para se  chegar até o mar. As cidades mineiras do Vale do Jequitinhonha estão tão perto da Bahia e, ao mesmo tempo, tão distantes considerando a desativação da linha férrea.No novo  circuito turístico o rio Gravatá desperta atenção com  belas cachoeiras descobertas pelo olhar sensível e curioso  daquele que  desbrava as paisagens  diversas  misturadas a farta  agricultura familiar pertinho da  Comunidade do Graça e do distrito do  Engenheiro Schonor. É preciso divulgar nossos encantos  valorizando a sabedoria  contida nos causos contados nas paradas sem pressa, nas delicias experimentadas nas vendinhas populares, nas feiras  ricas em  biscoitos, queijos, requeijões, doces e frutas de sabor incomparável. É só parar apreciar e sem pechinchar, negociar os mimos do lugar, e  ainda guardar na  memória os sabores do Vale.   

Texto: Aureliane Aparecida de Araújo.













Natural de Diamantina- Vale do Jequitinhonha- MG

Professora de Geografia do IFNMG campus Araçuaí

Graduada em Geografia pela Unimontes 

Pós graduada em Geografia e Meio Ambiente pela Unimontes 

Mestre em Geografia - Unimontes 

Doutoranda em Geografia e Tratamento da Informação Espacial - Puc Minas

terça-feira, 22 de março de 2022

O ASSUNTO É? - Gênero e política

 

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Aproveitando que há poucos dias tivemos o dia da “mulher”, com todas as contradições desta ideia de mulher que a data evoca, hoje decidi falar acerca dos livros de Margareth Atwood, “O conto da aia” e “os testamentos”. O primeiro livro repercutiu tanto que se transformou numa série. O segundo, é uma continuação da história da sociedade distópica de Gilead. Um país teocrático dominado por homens, no qual as mulheres estão submetidas às funções domésticas, reprodutivas e sexuais. O acesso a qualquer forma de leitura é proibido, até mesmo os nomes dos estabelecimentos não são identificados por letras e sim por desenhos, para evitar que as mulheres leiam. Parece que houve um acidente nuclear, a maioria das mulheres perdeu a capacidade de gerar bebês, daí, as que podem reproduzir foram escravizadas para gerar filhos para as mulheres dos comandantes, elas ficam numa casa até parirem, daí são mandadas a outra. Não podem ler, nem conversar com qualquer outra pessoa. É uma sociedade militarizada e vigiada por homens chamados de “Olhos”. As mulheres são separadas em grupos, as martas responsáveis pelo trabalho doméstico, as aias que são as reprodutoras, as esposas dos comandantes e as tias, que são mulheres que outrora tiveram altos cargos antes do fim das liberdades individuais e que agora servem a Gilead no controle e convencimento das demais mulheres. As idosas, as feministas e as lésbicas são eliminadas, ou mandadas para campos de trabalho forçado. Qualquer pessoa que se perturbe a ordem é suprimida em cerimônias rituais, seus corpos são dilacerados em linchamentos ou expostos no muro que cerca Gilead.  “O conto da aia” e “Os testamentos” são obras que devem ser lidas com atenção. Durante a leitura, é impossível não fazer associações com a sociedade em que vivemos, onde, dia a dia caminhamos para o completo domínio por religiosos misóginos e defensores de todas as formas de desigualdades. O dia 08 de Março, símbolo da luta das mulheres trabalhadoras por melhores condições de vida é atualmente despido desse significado e utilizado para romantizar a exploração das mulheres pelos homens em benefício dos que lucram no sistema capitalista, como bem demonstrou Alexandra Kollontai e outras tantas teóricas ao longo do tempo. Fica a dica de leitura. Até breve.


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terça-feira, 8 de março de 2022

O ASSUNTO É? - Dia de Feira

 

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Pimenta malagueta, rosca caseira, doce de leite, alface fresquinha, polpa de fruta, pastel de queijo e de carne. Biscoito escrevido, queijo cozido, tubão de leite, farinha fina, café torrado, goiaba de quintal, abacate um real a unidade. Pode olhar, freguesa, essa banca é de Dora, eu tô tomando conta pra ela. Dora! Ó a freguesa! Filé de tilápia, daqui da barrage.

Essas laranja é do Bananal, tenho arroz na casca e fubá caseiro. Cebolinha verde, erva de cheiro, erva-doce, pimenta do reino, doce de marmelo é de Fruta de leite. Hoje o ônibus veio cheio, tomara que não chova, senão atola. Leva uma dúzia e meia por dez, esse pequi é de Taiobeira.

No mercado municipal de Salinas me deslumbro com multiplicidade de aromas, de cores, de sons, de sensações. Passado e presente se entrecruzam na minha mente, enquanto círculo entre as bancas. Lembro José Raimundo dos Santos, meu pai, feirante de Bocaiúva, todos os sábados na Joaquim Costa em Montes Claros, lá conheceu minha mãe.

Fico imaginando como era a vida dele, o que pensava enquanto atendia suas freguesas. Será que também tinha esses devaneios de poesia cotidiana, afinal, era um leitor, me contou minha mãe. Aqui, olho as feirantes com seus rostos moldados pelo tempo oferecendo seus produtos e penso na importância da agricultura familiar. Mas esse assunto fica para o próximo texto. Bom dia!


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segunda-feira, 7 de março de 2022

MEMÓRIA CULTURAL - Tragédia prescrita

 

 

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            Era uma criança de aproximadamente sete anos, muito apegada ao meu pai. Era sábado, sabia que era dia de feira, porque  ficava contando os dias para que meu pai trouxesse frutas, doces, sempre chegava com a cesta cheia de coisas gostosas. Excepcionalmente neste dia, fui avisada que não havia feira, por causa da eleição,  meu pai tinha saído muito cedo.

             Minha mãe vendo minha inquietude pela casa, resolveu visitar sua sobrinha que havia ganhado criança. Ela tinha costurado camisolas lindas e  levaria para presenteá-la.

            Saímos à tarde, havia um movimento pelas ruas por causa da votação. Não entendia direito aquilo, mas ouvia falar em casa, nas ruas e as pessoas comentavam o tempo todo.

            Na casa da minha prima, podia correr e brincar com outras crianças á vontade. Porém, já tardezinha, entrou correndo pela casa adentro uma mocinha, outra  prima, procurando por minha mãe. Estava ofegante e tão logo avistou minha mãe, já foi disparando:

__”Tia, chegou um tanto de  polícia. Falaram que são polícias das cidades vizinhas para dar reforço ao grupo daqui. Estão armados até os dentes! Falaram que  estão  querendo pegar seu marido e o irmão dele. E os dois  estão no boteco, bebendo ali”. Apontando para a direção.

            Neste mesmo instante, a mãe levantou-se e foi ter com o marido e o cunhado. E eu, também saí em disparada a protestar na  frente de mamãe, implorando e sapateando, típico de quem sabia fazer birra, para conseguir o que quer: __“Eu quero ir, também. Deixa eu ir. Eu quero ver meu pai” .

Não deu outra, minha mãe, pegou minha mãozinha e saiu ligeiro para o bar. Logo avistou o marido e o cunhado  e vários homens bebendo, pareciam comemorar algo. Ela tentou lhe avisar dos policiais na cidade, pediu que pelo menos guardasse as armas, não era seguro. Porém meu pai ficou irritado e até gritou dizendo: __” Ninguém manda em mim. Daqui não saio! “

            Mas o irmão do meu pai, lhe acalmou e propôs a saída juntos: eu, mãe, pai e meu tio. Tínhamos acabado de entrar num carro, tipo jipe, quando aproximou-se muitos policiais armados, rodearam o carro, dando voz de prisão aos dois. Cercados meu pai e seu irmão, desceram do carro, com as mãos levantadas, recriminando aquela ordem, sem motivo.

             Quando olhei em direção ao bar, havia um corre-corre de pessoas fugindo. Estávamos sozinhas, naquela situação, assisti as cenas mais cruéis! Aqueles policiais  batendo no meu pai e no meu tio. Para mim e minha mãe só restava pedir aos gritos e em prantos. Uma gritava: “Não bate no meu marido, pelo amor de Deus!” e eu, tremendo, pulava de desespero, querendo salvar meu pai, levando  ponta-pés, chutes e murros: __”Pai, ele é meu pai, larga ele, faz isso com ele , não”...

            Após aquela sessão de espancamento, minha mãe e eu conseguimos levar  meu pai para dentro do recinto daquele bar, colocando-o sentado, todo ensangüentado e machucado.

            Eu de um lado e minha mãe do outro, em prantos e apavoradas, quando levantei os olhos, avistei um  homem na porta do bar, com sua arma apontada que disparou num golpe certeiro, no peito de meu pai, já indefeso e ensangüentado. Ali mesmo escorrendo da cadeira, ajoelhando-se. A bala penetrada fez um buraquinho no peito dele, mas estraçalhou-lhe as costas.E minha  voz  ecoou: ___” Você matou meu pai!” Parecia que tinha arrancado as costas de papai, espirrando sangue por todo lado.

Daí, só me lembro de  ser colocada num carro, chorando e implorando que queria  meu pai. Ainda desesperada e assustada, gritava: __”Porque mataram ele? “E o homem dirigindo falava que não tinha matado. Até chegar à casa de  outra sobrinha da minha mãe.

            Soube por conversas às escondidas, que meu tio, foi levado arrastado para a cadeia. E nunca mais soube ao seu respeito, porque fomos embora da cidade, mas nunca consegui esquecer este episódio.

            Em situações assim, nos dias atuais, horrores noticiados contra um país da Europa. Quanta criança atormentada, crescerá sobre estes efeitos nocivos?

             No Vale do Jequitinhonha também já se viu a tormenta provocada pela força bruta da política a “ferro e fogo”. Toda atrocidade fica prescrita um dia, mas os instantes das perdas e violências, jamais serão apagadas das mentes  que os deixarão atordoadas. Aquelas criaturas que sobreviverem, talvez consiga ao menos contar em súbita lucidez e sanidade, como esta menina, que hoje descreve uma tragédia prescrita.  

Contribuição de Frediano Olímpio Martins

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quinta-feira, 3 de março de 2022

DIÁRIO DE LEITURA - Não Acredito em Fantasmas

 

Mascarados, Carnaval Itinga - Foto: Jô Pinto


Diz até que não tem superstição. Mas mente. Nem só nisso, mente sempre. Veja bem, levanta com o esquerdo. Ora, não é tanto faz, não é qualquer pé, só sempre o esquerdo. Vê-se que isso é uma afronta de alguma espécie. E quem se atreve com o que não acredita? Era o carnaval de seus 11 anos. Os pais e o irmão estavam na cada da tia, que ficava logo do lado. Sabia bem onde a mãe guardava as moedas, das quais recebia, em cada noite, duas para festejar.

Teria duas mais.

Na hora de ir para a praça, o bônus. Recebeu duas moedas. Mas tão logo a falta foi sentida, tornou-se a primeira suspeita.

  Fui eu.

  Por quê?

  Não encontrei vocês.

  E por que recebeu outras duas.

  Esqueci.

Ela mente sempre.

A mãe brigou, mas não reouve o furto. Então tudo bem. Saiu um sermão mais encolhida, mas duas moedas mais rica. Duas moedas mais altiva.

No meio do caminho curto entre sua casa e a praça, avistou saindo do escuro, um grupo de mascarados. Malditas tradições. O coração palpitou. Para a história, perdera o medo com a madrinha ainda aos 3 anos. Claro, não se lembrava, mas todos tinham orgulho de contar.

E ela mentia sempre.

Mentiu de novo, porque fingiu, até para si mesma, que esqueceu algo em casa. Levou a mão à testa, deu meia volta e pôs-se a andar, mais rápido que de costume.

Queria acreditar que não havia nada de errado, mas algo a angustiava sensivelmente: por mais que tentasse pensar em qualquer outra coisa, ouvia um barulho que gelava sua barriga. O barulho aumentava e começou a andar mais rápido que qualquer outra vez. O barulho aumentava e, contrariando ao que insistia em se convencer, nem era um barulho qualquer. Havia um mascarado, cujo gemido parecia cada vez mais próximo.

Quis olhar para trás, como fazia sempre que tinha medo, para garantir que não era nada. Mas alguma coisa incomodava que era. O caminho se alongou, ou o tempo que esmoreceu, porque quanto mais caminhava e mais rápido, que não era um seu costume, mais longe parecia de casa.

Ele gemia alto como um vento em noite vazia e assombrada. Barulho de gente é que não era. E, dali para o futuro todo, não se esqueceria nunca mais. Ainda que mentisse.

Tinha o passo pesado, que batia com som de bota preta. Não eram passos rápidos, o que lhe deu mais medo, porque, em paradoxo, o gemido estava cada vez mais próximo. Quase gritou quando a sombra lhe alcançou. Grande, negra, lenta. Sem olhar para trás soube que ele tinha uma grande capa escura que ele movimentava como se sem pressa.

Talvez sua ansiedade é que desacelerasse os movimentos. Talvez.

 

Talvez a lentidão fosse mais uma crueldade. Do mascarado. De drama. Talvez.

Talvez fosse uma espécie de criatura sobrenatural, rápida sendo lenta. Talvez.

Ele gemeu mais alto, e ela desejou que fosse por estar mais perto. A alternativa outra era que fosse intencional. E a intenção seria crueldade. E a crueldade seria para ela, a essa altura, desespero.

Por tocar a maçaneta, gelada, teve que assumir que tremia. Voltou a respirar quando sentiu que a porta estava aberta. Gritou mãe, fingindo que ela estava lá, um pouco para assustá-lo, um pouco para acalmar-se. Entrou num relance, mas ainda pôde sentir a capa grande, negra e lenta tocando sua pele. Estremeceu.

Trancou a porta sem perceber.

Quando percebeu, alguns segundos depois, sentiu-se de alguma forma segura. Deu dois passos lentos para dentro da sala. Possivelmente, não havia ninguém em casa. Ouvia os passos e os gritos de outros mascarados descendo a rua. Arriscou mais uns passos.

Quando achou que poderia voltar a viver, ouviu mais uma vez o gemido vazio e cruel lhe assombrando.

Correu os olhos pela sala, para decidir para onde fugiria. Ele não estava lá dentro. Mas estava lá. Olhou para janela e viu, a máscara de palhaço, com cabelo alaranjado, sorriso irônico, e nariz vermelho. Não era tão feia. Pior mesmo foi olhar para seus olhos, que não existiam. Eram apenas dois vazios, totalmente negros e lentos. Não podia se mexer. Nem ele. Estava também preso. Ela não sabia se no receio ou na alegria de ser descoberto.

Ficou ali perdida na escuridão do medo, até que ele, grande, ergueu lentamente sua capa, escondendo o vazio que era, e caminhando lentamente, alcançou com facilidade o restante do bando de mascarados.

Queria ir até a janela, ver que ele ria de seu medo com os outros mascarados, ver que ele corria de cachorros, ver que ele existia de alguma forma, que não no vazio e na escuridão.

Não foi.

Quando a mãe chegou, confirmou para ela e inventou para si que havia esquecido o batom, que antes nunca levou, mas que então queria levar.

Saiu como se aquele momento não tivesse existido. Como se tivesse sonhado. Brincou, brincou, mas não sem olhar volta e meia ao seu redor, apenas para se certificar de que nenhum mascarado grande se atreveria a se aproximar. Olhava sempre para os olhos.

Voltou no horário marcado. Não por costume, que por regra nunca chegava no horário marcado, que era outra sua afronta, e mentia sempre, um novo motivo, ou um motivo esquecido, ou umas poucas vezes um motivo real. quando o motivo era real sentia medo, do castigo. Só mais um detalhe dela. Dessa vez não queria castigo. Fez quase todo o trajeto

Cresceu fingindo que crescia como se aquele momento não tivesse existido. Como se tivesse sonhado. Mas manteve a mania de olhar nos olhos. De tudo.

Era o carnaval de seus 30 anos. Os pais e o irmão estavam na casa da tia, que era logo ao lado. Pegou o dinheiro que ganhava e saiu. Brincou, brincou, mas não sem olhar volta e meia ao seu redor, apenas para se certificar de que nenhum mascarado grande se atrevia. Buscava sempre os olhos.

  Parece que você tem medo de mascarado.

  Não por superstições.

  Então pelo quê?

  São muito ousados.

  E por que não se afasta ao invés de encará-los.

  Por coragem – ela mentia sempre. Deu de ombros.

  Mas, certa vez conheci um mascarado sem olhos.

   Não é você quem diz que não acredita em fantasmas? Como pode existir um mascarado sem olho?

  Não acredito mesmo. Mas que esse existe, existe.


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quarta-feira, 2 de março de 2022

OPINIÃO DO BLOG - Guerras híbridas. O grande vilão é a informação distorcida.

 


No âmbito das relações internacionais as decisões políticas devem ser conduzidas por presidentes atentos a posicionamentos que contemplem interesses convergentes as agendas globais. Afinal, o processo irreversivel da globalização revela dependência, e ao mesmo tempo, integração escalada por exemplo, pelos BRICS / agrupamento dos países emergentes Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Na Ucrânia, o presidente eleito em 2019 tem mostrado que encenar não é o caminho das artimanhas políticas fundamentadas em guerras híbridas. A desestabilização politica é criada para eleger candidatos, ou para assegurar a manutenção no poder com notícias falsas, informações distorcidas, polêmicas construídas em torno de um suposto inimigo. São ações planejadas, estudadas, disseminadas como o fim de provocar confusão. Desde a campanha, o mesmo tem mostrado posicionamentos altamente controversos. Uma pena a grande mídia não ter divulgado suas pautas eleitorais. Então, a conta vem e, talvez no ápice das suas ações inconsequentes a meta quer seja o palco, a plateia pode ser o foco do comediante popular. Não dá para levar a sério quem expõe vidas humanas para manter seu show. É inadmissível lidar com o ego de um presidente que utiliza a Conferência de Segurança de Munique para criar um clima inoportuno de ameaça a ponto de sugerir o abandono do memorando de Budapeste de 1994 ao qual o desarmamento nuclear foi o objeto central. A Ucrânia tem muito a superar em termos econômicos, sem contar a influência da Rússia na porção leste do país, ou seja, muitos identificam com a Rússia e pronto. Aproveitar o dia dezenove de fevereiro para seguir na contramão e defender ampliação dos investimentos em armas nucleares. Soa como uma postura retrógrada ao ignorar as conquistas obtidas em âmbito internacional no que diz respeito a desnuclearização. A meta do presidente tem sido tornar-se membro da Otan, Organização do Atlântico Norte, que permanece ativa mesmo com o fim da Guerra Fria. Assim, fica a dúvida sobre

o papel da OTAN em um cenário desvinculado do Pacto de Varsóvia que oferecia suporte a URSS considerando o antagonismo do socialismo capitalismo. É arriscado eleger políticos inábeis que lidam com ações midiáticas e distorcem informações. Neste caso, torna-se altamente descabida postura de Zelensky, o presidente comediante, brincando com frágil economia da Ucrânia ao invés pensar caminhos para atrair investimentos ao país, escolheu investir no personagem que combate com vigor o inimigo, a Rússia e, assim coloca em xeque a segurança do país. Poderíamos pensar em segurança mundial, mas é difícil quem apoiaria a Ucrânia que anda na contramão do desenvolvimento social, ambiental, político e econômico.Durante a Cop 26 na Escócia o esforço para colocar em funcionamento agendas climáticas trouxe notoriedade ao uso das termoelétricas com gás natural na Alemanha, matriz energetica abundante na Rússia. A questão nuclear tem sido deixada de lado na Europa até mesmo nas termonucleares, tendo em vista que o que está em jogo são riscos ambientais como ocorreu em Fukushima, no Japão e Chernobyl na Ucrânia. Ainda assim, no ímpeto de promover seus projetos duvidosos, o presidente da Ucrânia discursou em favor da retomada do programa nuclear com ênfase nas armas. É importante destacar as relações de proximidade com os Estados Unidos especialmente com novo presidente, que possivelmente tem investimentos familiares no país. A grande vantagem da "Sociedade em Redes de Manoel Castells "está na das informações e o quanto está se tornando difícil ocultar informações por muito tempo. Hoje a leitura do território é processado agilmente por quem vive no lugar e fundamentalmente conhece as regras do jogo geopolítico. As mídias sociais esclarecem em uma perspectiva colaborativa, e esta mostra ingredientes que integram outras facetas do foco de tensão, sendo elas fundamentadas no controle no mar Negro, no escoamento do gás natural. Outro ponto abordado expõe o incômodo histórico que a Rússia impõe na Europa e Ásia levando em conta o aparato tecnológico no país. O problema que não estamos vendo com clareza está pautado em uma guerra em andamento e, esta pode estar fluindo em qualquer espaço, ou seja, a Guerra Híbrida projetada para desestabilizar governos por meio das notícias distorcidas. A grande mídia é especialista em mostrar fatos de acordo com determinados interesses. Talvez a situação da Ucrânia mostre que estamos mais preparados para lidar com notícias analisando que de todos os lados comete erros, no caso o presidente da Ucrânia brincou no dia 19 de fevereiro. O grande desafio é manter a informação limpa e deixá-la despertar a problematização e, assim iremos refutar a guerra híbrida que tem o objetivo de desestabilizar territórios, colocar no poder marionetes controláveis e, principalmente alinhados com lógica dos interesses norte-americanos envolvendo o gás natural, do petróleo em escala global.

Texto:



 










Aureliane Aparecida de Araújo 

Natural de Diamantina- Vale do Jequitinhonha- MG

Professora de Geografia do IFNMG campus Araçuaí

Graduada em Geografia pela Unimontes 

Pós graduada em Geografia e Meio Ambiente pela Unimontes 

Mestre em Geografia - Unimontes 

Doutoranda em Geografia e Tratamento da Informação Espacial - Puc Minas

GIRO PELO VALE - Caraí e o Vale de luto

Foto: UFMG É com muito pesar que comunicamos a passagem espiritual da artesã de Caraí, Dona Noemisa, uma baluarte do artesanato do Vale do...