terça-feira, 6 de julho de 2021

O ASSUNTO É? - Um amigo não se compra

 

Foto: Internet

“Pai, me compra um amigo?” É o título de um livro de Pedro Bloch, que li há muito tempo, cujo enredo falava de um menino rico e solitário. Penso que essa pergunta que nomeia o livro tem como resposta a seguinte frase de uma campanha de adoção de cães abandonados: “Um amigo não se compra”. O lema da campanha remete ao fato de os cães serem considerados, por muitos, os melhores amigos dos seres humanos. Convém falar brevemente desta relação que vem de muito tempo. A espécie Canis lúpus  teria sido domesticada há aproximadamente 135.000 anos e, desde então, convive com os seres humanos numa relação de mutualismo, ambos se beneficiando da aproximação. Os cães têm sido utilizados das mais diversas formas pelas sociedades humanas ao longo do tempo. Em troca, recebem “proteção” e cuidados. Uma das suas principais utilizações, especialmente nas sociedades contemporâneas, é como animal de estimação. Entretanto, nota-se uma preferência das pessoas por cães de raça definida, visto que parece símbolo de prestígio social e econômico ostentar um animal que custou caro. Muitas vezes, estes animais são tratados como mercadorias, explorados, vendidos e descartados como objetos. Outro dia, soube de uma criança   que acredita que os cães da raça Shitzu são todos iguais, como objetos de fábrica, sem apresentarem qualquer diferença entre um indivíduo e outro da mesma raça.  Foi levada a acreditar que, tendo dinheiro para comprá-los, podem ser substituídos como se substitui um brinquedo quebrado. Fiquei triste pela criança e pelos destinos de uma sociedade que investe em transformar os pequenos em consumidores. O contato com os cães pode humanizar as pessoas, desde que sejam ensinadas desde a infância a desenvolverem empatia em relação aos demais seres vivos e não tratá-los como coisas. Lembro-me de que sempre tive cães, todos sem raça definida (SRD), adotados da rua, alguns já adultos.

Minha primeira cadela de estimação recebeu o nome de Xuxa, isso no final da década de 1980. Nossa relação começou quando voltávamos os três da igreja, minha mãe, meu irmão e eu. Sempre para trás observando os detalhes das coisas, vi uma cachorrinha miúda de orelhas enormes, marrom, parecia uma raposa. Olhei para ela, ela olhou para mim, e foi amor à primeira vista, me seguiu até em casa. A partir daí passou a viver conosco. Era muito inteligente, lembro que certa vez roubou coxinhas na casa dos vizinhos  para alimentar seus filhotes, numa época em que a comida lá em casa era parca, mal dava para nós. O problema eram os longos cios e as inúmeras crias da cadelinha. Num período em que nem se ouvia falar em clínica veterinária, castração de animais domésticos era fora da realidade de nossa família. Minha mãe passava vergonha, uma vez que nossa casa não tinha muros e  Xuxa sempre nos seguia. Durante seus cios, a matilha vinha atrás e nos atropelava. Certa feita, entramos no lotação e Xuxa entrou atrás. Todos perguntavam de quem era aquela cadela, meu irmão e eu dávamos risada, enquanto minha mãe disfarçava o constrangimento. Acabou tendo a ideia de doá-la para outra família no bairro Maracanã. Chorei muito, não queria perder minha amiga, porém não houve jeito, Xuxa foi doada. Muitos meses se passaram, depois de um ano, saí no portão e olhei para o início da rua, lá vinha ela. Conseguiu atravessar a cidade e voltar para casa como a famosa cadela Lassie do filme.  Para conseguir enfim se ver livre de Xuxa e para minha tristeza, minha mãe a doou para uma família de outra cidade. Bem, ela não voltou.

Nas sociedades contemporâneas, com o crescimento das populações urbanas, tem chamado a atenção também o aumento das populações caninas, sendo esta uma questão que diz respeito ao bem-estar dos animais e também à saúde humana. Conforme os animais se reproduzem descontroladamente e vivem soltos pelas ruas, além de estarem sujeitos a maus-tratos, podem causar acidentes, contrair e transmitir doenças para outros animais e para as pessoas. O crescimento populacional dos cães e seu abandono se relacionam à falta de políticas públicas voltadas para a questão. Os poucos que adotam nem sempre se responsabilizam pelo cuidado dos animais, seja por falta de conhecimento, seja por falta de recursos econômicos. Além disso, como já foi dito, as pessoas geralmente preferem comprar cães de raça a adotar animais sem raça definida. E você: já adotou um cão SRD para ser seu melhor amigo?

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6 comentários:

  1. Belíssimo texto!!! É uma temática extremamente atual. A amizade é um tesouro que não se pode comprar. Ela nasce da alma e do coração. É parte do amar.

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  2. Parabéns pelo texto! Muito bem construído e oportuna as questões que foram levantadas. Em 2019 eu adotei uma cachorra SRD já adulta e abandonada com o seu filhote. Foi umas das melhores escolhas que já fiz, estamos felizes!

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    1. 💞😍 Obrigada Telma, são presentes valiosíssimos em nossa vida.abraço.

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  3. Amei o texto! Educativo e reflexivo em relação ao respeito e valorização dos animais e sobretudo faz nós pensarmos nos bens que a vida nos dá de presente e que com dinheiro não se compra. Parabéns!

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