segunda-feira, 30 de junho de 2025

MEMÓRIA CULTURAL - Theófilo Benedicto Ottoni e Christiano Benedicto Ottoni

Imagem internet


Jorge Benedicto Ottoni, um dos irmãos de José Eloy Ottoni e nascido em 1782, exerceu importantes cargos políticos na Vila do Príncipe, tendo sido vereador e senador, além de tabelião. Casou-se, em 1807, com Rosália de Souza Maia e, da união, nasceram doze  filhos, sendo que dois deles foram muito relevantes para a história do Brasil: Theófilo Benedicto Ottoni e Christiano Benedicto Ottoni.

            Theófilo Benedicto Ottoni nasceu em 1807 e destacou-se na política brasileira, tendo sido ferrenho defensor do Republicanismo e do Liberalismo. Até os 15 anos, ocupava-se do comércio e acompanhava seu pai em viagens com as tropas, não tendo recebido nenhuma instrução. Com essa idade, ele e mais três irmãos passaram a morar com o tio José Eloy Ottoni, quando iniciaram seus estudos e serviram na Marinha. Ao requerer baixa da Marinha, em 1830, Theóphilo Ottoni retornou ao Serro para dedicar-se à carreira política e fundou o periódico “Sentinela do Serro” no qual defendia suas ideias liberais e democráticas. Participou da Revolução Liberal de 1842 que terminou com a derrota dos insurgentes em Santa Luzia e, como consequência, sua prisão. Posteriormente, foi beneficiado pela anistia decretada pelo imperador D. Pedro II.

Após exercer o mandato de Deputado Federal, afastou-se da política devido à derrota dos liberais para os conservadores e fundou, em 1848, a “Companhia de Comércio e Navegação do Rio Mucuri”. Com o objetivo de promover o desenvolvimento da região, Theófilo Ottoni procurou ligar o sertão mineiro a um porto marítimo, incentivou a instalação de imigrantes europeus na região e desenvolveu um núcleo urbano que recebeu o nome de Philadelphia. Em 1860, por motivos políticos, a Cia. Mucuri foi encampada pelo governo.

            Assim, Teophilo Ottoni retornou à política e foi eleito Deputado Federal e, logo após, Senador. Teve destaque na famosa “Questão Christie”, um importante impasse diplomático do governo de D. Pedro II, que culminou com o rompimento das relações entre Brasil e Inglaterra, ao liderar um importante movimento contra as pretensões imperialistas dos ingleses.

            A campanha do Mucuri fragilizou sobremaneira a sua saúde e, em 1869, faleceu Teophilo Ottoni. Desse modo, apesar de ter sido um dos maiores defensores do republicanismo no Brasil, acabou não assinando, em 1870, o Manifesto Republicano de Itu, documento fundamental para o movimento republicano brasileiro.

            Christiano Benedicto Ottoni nasceu em 1811 e, com Teophilo Ottoni, morou na casa do tio e serviu a Marinha na qual se reformou como Capitão Tenente. Formado em engenharia, foi professor de matemática na Academia da Marinha e publicou vários livros didáticos de matemática que foram usados no ensino brasileiro da época. Participou, também com o irmão, da epopeia de colonização do Vale do Mucuri, tendo sido o elaborador do projeto da estrada de rodagem entre Philadelphia e Santa Clara (atuais Teófilo Ottoni e Nanuque, respectivamente), a primeira via desse tipo do Brasil.

            Apesar de, politicamente, ter sido um inimigo de D. Pedro II, este o considerava um excelente engenheiro e administrador. Assim, Cristiano Ottoni exerceu o cargo de Presidente da Estrada de Ferro D. Pedro II, a primeira ferrovia brasileira, entre 1855 e 1865. Por isso – e por ter sido ele o homem responsável pela expansão das linhas férreas em direção a Minas Gerais e São Paulo –, Christiano Ottoni é considerado o “pai das estradas de ferro no Brasil”.

            Também atuou no campo da política, tendo sido eleito como deputado pelo Partido Liberal e, posteriormente, por duas vezes, senador. Era defensor do ideário republicano e liberal e foi um dos signatários do Manifesto Republicano de Itu. Embora não seja lembrado como um literato, Christiano Ottoni deixou algumas obras de sua autoria, tais como as biografias de Teophilo Ottoni e de D. Pedro II, “Futuro das Estradas de Ferro no Brasil” e “História da Escravidão no Brasil”. Além disso, era um notável polemista e escrevia artigos contrários aos seus adversários políticos, publicando-os na imprensa.

            Christiano Ottoni faleceu aos 85 anos, no Rio de Janeiro. Por ter sido um grande engenheiro brasileiro, foi escolhido como patrono da Escola de Engenharia da UFMG, criada em 1911. Foi homenageado ainda com a criação, em 1974, da Fundação Cristiano Ottoni, uma instituição de pesquisa vinculada à UFMG. Sua descendência também contou com destaques para a história brasileira, em especial seu filho Júlio Benedicto Ottoni e seu neto Raymundo Ottoni de Castro Maya.

 

Referência:

Antigas Oficinas Christiano Ottoni:

http://curraldelrei.blogspot.com/2016/11/antigas-oficinas-christiano-ottoni-na.html - acesso em Setembro de 2024

Autor: Alessandro Borsagli


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quinta-feira, 26 de junho de 2025

DIÁRIO DE LEITURA - Tese de Doutorado de Thaisa Silva Martins

Foto: Arquivo Pessoal




Se o objetivo é compreender como as epistemologias negras têm tensionado as estruturas do conhecimento acadêmico, deixamos como dica a tese de doutorado de Thaisa Silva Martins, defendida no Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), constitui uma leitura fundamental. Intitulada “Erguendo a voz: um ensaio sobre o enfrentamento à violência através das Escrevivências de mulheres negras”, a pesquisa configura-se como uma produção que articula rigor teórico, posicionamento político e elaboração estética, assumindo o compromisso de romper com o silenciamento histórico das mulheres negras no Brasil e em contextos pós-coloniais.

Logo nas primeiras páginas, a autora evoca a contundente afirmação de Marielle Franco — “Não serei interrompida” — como enunciado inaugural de um projeto epistemológico insurgente. Trata-se de um trabalho que reivindica o direito à fala e à escuta em um campo científico historicamente marcado por assimetrias de raça, gênero e classe. Martins adota o ensaio como forma e método, não por ausência de sistematização, mas como uma escolha intencional de ruptura com a normatividade acadêmica e com os paradigmas eurocentrados de produção de conhecimento. Seu texto performa uma escrita que se pretende situada, implicada e transformadora.

A noção de Escrevivência, cunhada por Conceição Evaristo, constitui o eixo conceitual em torno do qual se articula a análise da autora. Tal conceito, que compreende a escrita como prática enraizada nas experiências de vida de sujeitos negros — especialmente mulheres —, é mobilizado como ferramenta teórico-metodológica e política. Contra a tradição do distanciamento impessoal e da neutralidade epistêmica, Martins reivindica uma escrita que emerge do vivido, do corpo e da memória, e que se inscreve como ato de resistência e de reexistência. A autora se insere nessa linhagem, produzindo um texto que se recusa a apagar os corpos negros da história e da ciência.

O corpus da pesquisa é composto pelos relatos de violência presentes na obra Raízes: resistência histórica, publicada pela editora feminista Venas Abiertas. A coletânea reúne narrativas de mulheres negras brasileiras, que escrevem a partir de suas trajetórias. A análise recai sobre os trechos que tematizam formas de violência estruturante — racismo, estupro, escravização, patriarcado, pressão estética — cuja recorrência revela a permanência de estruturas de dominação que operam de modo interseccional. A leitura proposta por Martins vai além da exposição das violências: busca evidenciar o que se repete, o que ecoa, o que sobrevive na palavra escrita, mesmo sob condições de silenciamento.

Para além da análise textual, a tese constrói um sólido aparato teórico e histórico, por meio do qual insere a Escrevivência em um contexto mais amplo de crítica ao colonialismo, ao patriarcado e ao capitalismo racial. O diálogo com autoras e autores como Grada Kilomba, Aníbal Quijano, Silvia Federici e Angela Davis sustenta uma leitura crítica das continuidades entre o projeto colonial moderno e as formas contemporâneas de exclusão. Um dos momentos mais emblemáticos do texto é a retomada da imagem de Anastácia — mulher negra silenciada por uma máscara de ferro durante a escravidão — como figura paradigmática de uma violência que persiste, ainda que sob novas formas e dispositivos.

A tese assume ainda um caráter autobiográfico, na medida em que a autora insere sua trajetória pessoal e acadêmica no desenvolvimento da pesquisa. O processo de reconhecimento identitário como mulher negra atravessa a escrita e sustenta a escolha do objeto, da metodologia e da abordagem. Tal gesto evidencia uma concepção de ciência comprometida com a vida, com a ética e com a transformação social. A implicação da pesquisadora com o tema fortalece a dimensão política da obra e reafirma que todo conhecimento é situado, como argumentam teóricas feministas decoloniais.

Ler Erguendo a voz é, portanto, acompanhar um exercício de produção de conhecimento que desafia os cânones tradicionais da academia, reivindicando a legitimidade das narrativas negras como fonte de saber. A tese apresenta contribuições relevantes para os campos dos estudos de gênero, das relações raciais, da literatura afro-brasileira e das metodologias críticas e decoloniais. Constitui uma leitura incontornável para aqueles e aquelas que compreendem a escrita como instrumento de luta, memória e transformação.

A autora nos oferece uma obra que é, ao mesmo tempo, denúncia e proposição; um texto que ressoa como grito, mas também como esperança. Um trabalho que se insurge contra o epistemicídio e que, ao fazê-lo, ergue outras vozes — vozes que, há séculos, foram silenciadas, mas que seguem insistindo em existir.

 

Boa leitura!

 

 Acesse a tese completa: https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/18707


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terça-feira, 24 de junho de 2025

CONTOS E CRÔNICAS DO JEQUI - O Engenho

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          Essa história foi contada pelo nosso amigo Eronilto Mendes, mas conhecido como Trabion, um poeta de primeira grandeza da cidade de Jacinto, no Baixo Jequi, mas ele é também um grande contador de causos. E como todo contador de causos, ele diz: Pode acreditar, não é mentira!

 

No meu tempo de criança era comum aqui na região onde moro até hoje, as pessoas fazerem rapaduras.

O meu pai mesmo tinha uma fábrica. Cultivou um canavial, montou um engenho, todo feito de madeira, não sei se você já teve oportunidade de ver um. Naquele tempo eram feitos à mão, num trabalho artesanal com muita perfeição. As moendas tinham umas cavas formando assim dentes que quando se juntavam as duas e ao serem puxadas por uma parelha de bois em movimento circular, rodavam-se uma em volta da outra se encaixando os dentes nas cavas uma da outra, e ali era colocada a cana para ser moída, retirando-se o caldo (garapa) pra fazer rapadura, só que não é isso que eu quero lhes contar, e sim um fato ocorrido com os bois que puxavam o engenho.

Um dia foram soltos no pasto, e quando o meu pai foi procurá-los para o trabalho, simplesmente eles tinham desaparecido sem deixar pistas. Foi um grande alvoroço, muita procura, perda de serviço, até que após uma semana, o meu pai encontrou-os num estado de fazer pena dentro da mata que tinha junto a pedra grande que tem aqui na fazenda.

 Os bois acostumaram com o barulho que o engenho fazia enquanto era puxado, e ao passar debaixo de uma grande árvore, onde em cima estava um upo de macacos guaridas, como são conhecidos por aqui, ouviram o barulho que eles faziam por estarem na época do acasalamento, os bois confundiram com o barulho do engenho e começaram a rodar em volta da árvore. Os guaribas vendo os bois em baixo, ficaram com medo de descer e continuaram a cantoria e os bois continuaram a rodar.

Quando meu pai Alvino, homem que nunca mentiu, viu aquela cena, ficou muito emocionado e até chorou. Calcula-se que os animais ficaram nesse ritual por volta de uns sete ou oito dias sem comer ou beber água.

Foi preciso amarrar os bois para serem retirados do local que estavam, e muitas pessoas foram visitar o lugar e constataram que tinham feito duas estradas de tanto os bois pisarem o chão dia e noite sem parar por uma semana.

Causo narrado por Trabion de Jacinto/MG


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segunda-feira, 23 de junho de 2025

MEMÓRIA CULTURAL - Os ciganos e as peças de ouro

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Na minha infância, costumava ir para roças de famílias conhecidas e uma das coisas que me chamava atenção naquelas cozinhas, eram os tachos de fazer doces em tamanhos variados.

            A características destes utensílios podiam ser vistos como preto por fora e avermelhados por dentro que reluziam em contato com os raios de sol que entravam nas frestas das janelas. Cheguei a pensar que aquilo devia ser feito de ouro, de tanto brilho que tinha. Ficavam pendurados em ganchos acima do fogão ,  debaixo de mesas grandes de madeira, ou, naqueles quartinhos , que  conhecemos como despensa    E para aguçar minha imaginação, achava que somente ciganos é quem fazia esses tachos, porque de tempos em tempos , apareciam uns ciganos diferentes, armavam suas barracas, instalavam suas famílias por ali  e  os homens tinham carros carregados de peças daquelas que eu via nas casas, desde alambiques para fabricação de cachaça, serpentinas  para esquentar água e vasilhas como os tachos para fazer doce e rapadura, principalmente..

            Como os ciganos gostavam de ouro, a começar pelos dentes, relógios e as mulheres cheinhas de colares, pulseiras, brincos e confirmavam que era ouro, então achava que as peças que eles vendiam também era de ouro.

             E acreditava que havia grupos de ciganos mais rico que outros, pois tinham aqueles que faziam alvoroço quando entravam na cidade, roubando tudo que achavam, desde galinha, porco e na esperteza da leitura das mãos, esse considerava pobres só sabiam roubar e trapacear nos negócios com os cavalos, enquanto os ciganos ricos não causavam confusão e viviam a negociar suas mercadorias reluzente que para mim, era tudo de ouro.

            Até o dia que passei a frequentar às escondidas a barraca de uma família cigana. Entre conversas e curiosidades me contaram que as peças que vendiam não eram de ouro, mas cobre. E que os ciganos, eram grupos nômades com diferentes gerações, mas que gostavam e prezavam a vida daquela maneira e cada grupo tinha seu jeito de ser e sobreviver.

 

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MEMÓRIA CULTURAL - Theófilo Benedicto Ottoni e Christiano Benedicto Ottoni

Imagem internet Jorge Benedicto Ottoni, um dos irmãos de José Eloy Ottoni e nascido em 1782, exerceu importantes cargos políticos na Vila do...