segunda-feira, 28 de abril de 2025

MEMÓRIA CULTURAL - Em nome de Olorum, de Oxalá e de Ifá!

Foto: Internet

 Dom José Maria Pires foi uma figura profundamente admirável e revolucionária em muitos aspectos. Seu legado transcende o âmbito religioso, tocando áreas como direitos humanos, defesa da dignidade dos mais vulneráveis, e valorização da cultura afro-brasileira. Ele não apenas desafiou preconceitos, como também os enfrentou de maneira corajosa e transformadora.

         Dom José Maria Pires, mineiro de Córregos, distrito do município de Conceição do Mato Dentro, nasceu em 15 de março de 1919. Aos doze anos ingressou-se no Seminário em Diamantina, aos vinte e dois anos ordenado presbítero, exercendo seu ofício de pároco em Açucena-MG (1943-1946); diretor do Colégio Ibituruna em Governador Valadares-MG (1946-1953); missionário diocesano (1953-1955); e pároco de Curvelo-MG (1956-1957). Nomeado Bispo de Araçuaí em setembro de 1957, onde trabalhou incansavelmente pela Diocese de Araçuaí, criando o primeiro seminário menor, para futuros seminaristas; o Patronato “São José” para atender jovens meninos em regime de internato; o Ginásio Industrial Complementar “São José”, para atender a antiga quinta e sexta série que durou de 1965 a 1972(atualmente conhecemos como E.E. Industrial São José). Em 1965, foi nomeado Arcebispo da Paraíba, enfrentando incompreensões, a começar pela   rejeição à sua negritude, foram muitos os gestos de repulsa a ele, principalmente por parte da elite mas encontrou nos movimentos das Comunidades Eclesiais de Base, as Caminhadas da Pastoral da Terra e outros movimentos e pastorais para combater as desigualdades.

         Primeiro negro nomeado a bispo no Brasil, tinha apelidos de Dom Pelé ou Dom Zumbi. Ele celebrou a primeira missa negra católica no Brasil, a Missa dos Quilombos celebrada em 20 de novembro de 1981, em Recife. Assumindo assim a realidade de sua negritude e aprofundou com coragem a aproximação da liturgia da Igreja com a liturgia dos afrodescendentes. Certa vez numa  reunião com bispos, ele começou, assim, a missa: 'Em nome de Olorum, de Oxalá e de Ifá'. A assembleia respondeu: 'Axé'. Diante do ar de desaprovação dos colegas, justificou-se: 'Se eu posso invocar a Trindade em português, latim e grego, por que não em língua nagô?'  E deu uma risadinha irônica com um sorriso leve de agradecimento". Isso nos revela sua ousadia e criatividade ao conectar a espiritualidade e identidade cultural.

          Na época da Ditadura Militar, desenvolveu um trabalho pautado na conjunção da atividade religiosa com a defesa dos direitos humanos, com vistas à mudança social. Prestou apoio nos conflitos pela terra na Paraíba, defendendo camponeses de perseguições. E lutou contra a discriminação e o racismo, incentivando a organização e a luta dos afro-brasileiros, do qual destaca-se em um de seus discursos na CNBB “Enquanto imperar a fome, a miséria e o analfabetismo, enquanto não se respeitar no operário e no camponês a dignidade da pessoa humana, os cristãos não estarão sendo cristãos”.

Mas quando completou setenta e cinco anos, renunciou do seu cargo, encaminhando sua Carta de renúncia à Santa Sé em 23 de maio de 1994, sendo aceito  e reconhecido  como  Arcebispo Emérito da Paraíba . Faleceu no dia 27 de Agosto de 2017 com 98 anos de idade devido a complicações de uma pneumonia.

Dom José tinha como lema episcopal: “Scientiam Salutis” (A ciência da Salvação). Foi o quarto Arcebispo da Paraíba e autor de quatro obras:

  • O grito de milhões de escravas: a cumplicidade do silêncio (1983)
  • A cultura religiosa afro-brasileira e seu impacto na cultura universitária (2014)
  • Meditações diante da cruz (2015)
  • O sacerdote, imagem de Cristo (2016)

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