O
Primeiro Beijo Gay da Noite Literária
Por Ângela Freire
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Moa, autor da poesia ( Em Saudades) |
A noite
literária desde que foi acoplada ao
Festivale, a partir de 1992, aconteceu
em praça pública, clube e escola. É
considerada como momento ímpar, que inspira elegância e requinte. Além de
oportunizar a participação e a expressão artística, garantindo a participação
do protagonismo dos artistas do Vale do Jequitinhonha, através da literatura,
com lançamento de livros e apresentações
de poesias, com interpretações
memoráveis.
Em 2006, na cidade de Araçuaí, aconteceu
o 24º FESTIVALE, a noite literária em sua 11ª edição, tinha de fazer jus a um
local que traduzisse o momento, foi apontado para o Colégio Nazareth. Não
apenas por ser uma instituição educacional, mas por representar a bravura de
mulheres, vindas da Europa em 1926 para viverem uma experiência educacional
e religiosa em Araçuaí. As Irmãs Penitentes Recoletinas, de Oirshot contribuíram
e continuam a trabalhar para a formação de muitos jovens , do Vale do
Jequitinhonha.
Fui pessoalmente com o ofício em mãos, conhecia bem as irmãs desta instituição. Fui
muito bem recebida, ao fazer a solicitação, logo fui prontamente atendida, e, a
irmã fez questão de ceder o espaço do salão nobre, sem nenhum ônus sequer com a
seguinte advertência: __Estamos cedendo porque te conhecemos bem. Apoiamos a
cultura , só te peço que tome cuidado com o salão , cumpra o horário
delimitado e não tenha manifestações
indecentes, somos um colégio de freiras e devemos zelar pela nossa
Congregação. Imediatamente empenhei a
minha palavra e além
de entregar-lhe o ofício, insisti para que viesse assistir aquela noite
memorável!
A
comissão de decoração muito criativa entrou em ação, pega emprestado ali, outro
doa um arranjo, alguém limpa, costura, prega, mede, cola e a ornamentação fez
jus aquela noite com muito nobreza e bom gosto!
Quando me
adentrei no salão, logo avistei as três irmãs franciscanas, na primeira fila,
cumprimentei-lhes eufórica, porque o recinto estava lotado! Caminhei em direção
ao camarim para cumprimentar os poetas e intérpretes, quando reparei alguém
trajando um tecido rosa, amarrado à
cintura e alguém lhe pintando o corpo
com purpurina. Curiosamente perguntei o que significava, mas a resposta veio
imediata do poeta, Marcos de Oliveira Almeida ( Moa), que sussurrando baixinho, com um sorriso
estampado de ansiedade: SURPRESA AMIGA!
A noite
literária seguiu de acordo com o cerimonial, cada obra melhor do que outra,
deixando os jurados tensos no julgamento. Mas a tensão pior foi a minha, quando
o mestre de cerimônia chamou a última poesia intitulada “JEQUITIAMO”. Até ai não havia nada de estranho, a poesia era uma declamação em favor do rio e sua paisagem
tropical. O cenário continha muitas
folhas secas e apenas um galho afixado no interior,mas, numa interpretação,
tudo é válido na versão do seu autor. No entanto, tomei conhecimento daquilo num estalo e tamanha minha surpresa porque
a figura masculina que tinha
visto no camarim, se posicionou aos
fundos, na frente do galho seco. O tecido rosa , era um
perizônio, entronizado a figura de São Sebastião!
Uma
versão diz que o santo negou-se a
praticar atos sexuais com o imperador, por isso foi assassinado. Alguns
historiadores contam que há fortes indícios também que Sebastião era amante do
imperador Diocleciano. Outras dizem que ele arrumou um amante e foi descoberto.
Hoje, ele é considerado também o santo das grandes epidemias, na idade média
era o santo protetor da lepra, depois tornou-se da AIDS. Santo padroeiro da cidade do Rio de Janeiro,mas
ali estava na cena, como um
Ébano.Congelei-me neste instante e presumi que algo impactante aconteceria. Não
deu tempo nem de imaginar, pois o
autor não declamava mais, ele estava a declarar-se :
“(...)
Jequitiquero perto de mim pra novamente
Sentir
o amor inocente tocar em seu corpo
E
sentir em seus lábios o doce do mel.
Jequitiamo por te conhecer, por ter estado
perto de você, por andarmos juntos, cantar a
mesmo
língua
e sentir o mesmo amor.”
Não conseguia
acompanhar as falas, só pude ouvir da
platéia, num único som de “oh!” e em
seguida aplausos. Pronto: O primeiro beijo gay, estava protagonizado na noite literária!.
Quando olhei em direção das pobres irmãs, já estavam no final da porta, sem olhar para trás, segurando
seus rosários. Sabia que, quando tivesse de entregar a chave, haveria de
escutar!
O sermão
foi certeiro e durante muito tempo dei muitas voltas para não ficar perto das
irmãs, que lembravam daquele beijo!
OBS. Não encontramos fotos ou videos da noite literária do 24º Festivale em Araçuaí, se alguém tiver faça contato.