“Foi durante uma semana santa em Itinga
que cresceu meu amor pela religiosidade popular, cujo estudo hoje ocupa mais da
metade de meu tempo. Como é admirável a fé do nosso povo rural e como é rica
sua expressão. Aqui vemos como nosso povo do vale do Jequitinhonha com todo seu
sofrimento se identifica com o Cristo que sofreu”.
Frei Franciscus Henricus van der Poel
(Frei Chico) - OFM /Itinga - 1976
Celebrar ou
rememorar os últimos dias da vida de Jesus no plano terrestre e uma tradição
que é chamada de Semana Santa. Todos os ritos desta tradição acontecem em toda
as cidades do vale do Jequitinhonha, mas cada cidade tem a sua particularidade
emcelbrar, e para o povo do vale do Jequitinhonha essa tradição tem um
significado muito importante.
Em Itinga não é diferente, pelo contrario foi em outrora
e continua sendo até os dias atuais um momento de muita força e fé da
religiosidade popular, no qual é
celebrada a mais de 170 anos.
A semana santa começa no
domingo de ramos onde os fieis levam plantas e ramos, principalmente as de caráter
medicinais para serem abençoadas, onde estas serão transformadas em chás e
usadas para curar possíveis enfermidades, outros ramos são transformados em
cruz e colocados atrás da porta da entrada da casa para proteger os lares.
Na terça - feira santa as imagens de Senhor dos Passos e de Nossa
Senhora das Dores é levada para casa de duas pessoas escolhidas
antecipadamente, para que no outro dia na quarta –ferira santa possa acontecer
à procissão do encontro, pela tradição os homens acompanham Senhor dos Passos e
as mulheres Nossa Senhora das Dores, esta passagem emociona a todos os fieis,
pois a mesma representa o encontro de Maria com Jesus quando este seguia para o
calvário.
Na quinta – feira santa a ultima ceia é representada pela missa
dos lava pés,onde o padre lava os pés de 12 fieis, repetindo o que Jesus fez ao
lavar os pés dos 12 discípulos e institui a eucaristia.
na sexta – feira santa, ou sexta - feria da Paixão, acontece uma
das maiores manifestações de fé coletiva
e de religiosidade popular de Itinga,
pela manhã acontece a via sacra pelas ruas da cidade, às três horas da tarde
tem o beijo da cruz e a noite tem a leitura da paixão, logo após segue se
em cortejo a procissão do Senhor Morto acompanhado por milhares de
fieis que vem de todas as comunidade rurais do município e de cidades vizinhas,
durante o cortejo os mesmos entoam cânticos, benditos e ladainhas.
O ponto alto da procissão é quando Verônica canta o “Mater
Dolorosa” nas calçadas mais altas por onde o esquife passa com o Senhor Morto.
Após a procissão acontece a adoração do Senhor Morto na igreja
onde os fieis passam a noite rezando e entoando ladainhas, benditos e
excelências, muitos fieis trazem pão, biscoito e café para aguentarem passar a
noite e os filhos são colocados nos cantos da igreja para dormirem, e pela
manhã quando o esquife ia ser guardado se houve muito choro e lamentação, para
os fieis este é o momento em que cristo iria ser sepultado.
No sábado tem a benção do fogo e a missa da Vigília onde se
aguarda a ressurreição de Jesus Cristo
No domingo se celebra a missa de Páscoa, para marcar a
ressurreição de Jesus Cristo,
Nas ruas ao lado da igreja e do mercado varias barraquinhas
ofereciam comidas, quitandas e café. A venda de bebidas alcoólicas eram proibidas
e muitos bares e vendas não funcionavam. Essa tradição nesse formato perdurou
até a segunda metade da década de 1980.
Por determinação da diocese de Araçuaí, foi estabelecido que a
igreja Matriz de Itinga não poderia ficar mais aberta para a adoração do Senhor
Morto, que a mesma deveria ser fechada assim que terminasse a procissão, os
motivos alegados era o clima de festivo que se tinha ao redor da igreja em uma
dia que deveria ser de luto.
Houve muita confusão e
revolta dos fieis, mas a ordem foi cumprida, as comunidades passaram a celebrar
a sexta – feira santa em suas próprias comunidades e a cada ano diminuía o
numero de fieis na Igreja Matriz, com isto a tradição da sexta-feira santa
perdeu um pouco de seu brilho como manifestação de religiosidade popular.
Quando Pe. Mario Uzam assume a Paróquia de Itinga, ele consegue
autorização da Diocese para que a Igreja permanecesse aberta enquanto os fieis aguentassem ficar.
A sexta – Feira santa continua sendo nos dias atuais uma das
maiores manifestação expressividade de fé popular de Itinga, porém nunca mais
voltou a ser como era no passado
Hoje se tem a encenação da “ Paixão de Cristo “ narrando os
últimos dias de vida de Jesus. A igreja permanece aberta para adoração do
Senhor Morto, porem os fieis já não ficam mais a noite toda e geralmente pouco
mais da meia noite o esquife é guardado enquanto se entoa o benditos e cantos
de lamentações.
Quando começa a cantar o bendito abaixo, todos entendem que é a hora
de despedir do Senhor Morto, levantam, faz suas orações, passam a mão na imagem
do Senhor Morto. E enquanto a imagem é levada para sacristia os fieis entendem
esse gesto como do sepultamento e a muita lamentação, como se os fieis estivem
mesmo sepultado o Jesus Cristo.
Lenta e calma sobre
a Terra
desce a noite foge a luz,
quero agora despedir-me
boa noite meu Jesus
Em silencio no sacrário
rósea chama treme luz e suave canta os Anjos
boa noite meu Jesus
O Senhor dá-nos a benção
e do mal que nos seduz
aos meus pais e a mim guardai-me
boa noite, meu Jesus.
Coração quem dera
fosses
lamparina eterna luz
porque tanto eu daria
boa noite meu Jesus
O texto foi adaptado do Livro “ Memórias de Itinga” de Jô Pinto
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