Victor Lamparelli nasceu em 12 de janeiro de 1897, na cidade de Acquaviva delle Fonti, província de Bari, Itália. O pai dele, Savério, junto com outros dois irmãos (Francisco e Cármino), possuía uma cerâmica, localizada entre as cidades de Acquaviva delle Fonti e Potignano, a qual abastecia uma grande região, produzindo e comercializando tijolos furados, telhas, manilhas, vasos, talhas, bilhas (moringas), caçarolas e potes de barro
Em 1902, o irmão mais novo deles, Francisco, veio com sua esposa para o Brasil, atraído pela possibilidade de trabalhar na atividade cafeeira. Estabeleceram-se em São Bento do Sapucaí-SP, numa fazenda de café. Não tendo conseguido adaptar-se ao tipo de trabalho, eles então se deslocaram para a cidade de Tambaú-SP, onde Francisco começou a trabalhar em uma empresa cerâmica. No mesmo ano, Francisco convenceu seus outros dois irmãos a virem, com suas famílias, ao Brasil; assim, Victor chegou ao Brasil com seis anos de idade, acompanhado de seus pais. Em 1903, os três irmãos instalaram a “Cerâmica Lamparelli” na cidade de Casa Branca-SP, a qual produzia potes, talhas e moringas.
Por volta de 1914, atraído pela abundância e boa qualidade da argila, Savério resolveu transferir-se para a cidade de Itobi, junto com seu filho Victor, onde instalou outra cerâmica, especializada em produzir peças cilíndricas, em que Victor auxiliava o pai nas atividades da empresa.
Em 1919, com 22 anos, Victor casou-se e resolveu mudar-se para Jaboticabal, pois tinha interesse em abrir sua própria cerâmica, e tinha a informação de que, no Córrego do Tijuco, próximo à cidade, havia uma jazida de “barro branco”. Sem recursos financeiros, conseguiu emprego na “Companhia Cerâmica Moderna”, de Lourenço Záccaro. Esta empresa possuía duas seções: uma que fabricava potes, talhas, moringas, garrafões e vasos; e outra que produzia manilhas, telhas e tijolos furados e comuns. Como conhecia bem os processos e técnicas ceramistas, logo se tornou o principal funcionário da empresa.
Em 1920, o proprietário da empresa, que também era farmacêutico, resolveu abandonar as atividades ceramistas, e a “Cerâmica Moderna” foi oferecida a Victor. Este então se aproveitou do estoque e de alguns equipamentos (tornos e peças) e deu prosseguimento às atividades da empresa, agora sob sua propriedade. Dessa forma, Victor iniciou as atividades da chamada “Cerâmica Lamparelli”, utilizando-se de sua própria capacidade de trabalho e a de sua esposa (que pintava moringas, talhas e vasos), além de ter mantido dois funcionários portugueses oriundos da extinta “Cerâmica Moderna”. No mesmo ano, iniciou a produção e comercialização daquilo a que chamou de “filtro reto”: uma talha de barro composta por duas partes, sendo que, entre elas, se colocava um “disco” poroso, feito de uma mistura de barro, carvão e outros componentes, que tinha a função de filtrar a água. Esse “disco” era colado entre as partes da talha com uma mistura de breu e cera, para que a água não vazasse. Na parte de baixo do filtro era colocada uma torneira de chumbo, para extrair-se a água.
Em 1922, Victor mudou-se para o centro da cidade e instalou um depósito, na sua própria residência. No mesmo ano, comprou um brejo próximo à estação ferroviária e iniciou a construção de dois barracões, que seriam as novas instalações da cerâmica.
Em 1928, a “Cerâmica Lamparelli” possuía uma gama de produtos bastante diversificada no entanto, o produto responsável pelo maior crescimento da empresa, e que a tornaria conhecida em várias regiões do Estado, foi o filtro “São João”, uma utilidade que representou um grande avanço na purificação doméstica da água. E, o surgimento de redes públicas de abastecimento de água, em muitas cidades, já a partir dos primeiros anos do século XX, apesar de ter melhorado o modo de vida das populações, em princípio, não contribuiu para alterações no modo de obter-se água potável, pois o tratamento da água à época era insuficiente para beber-se a água diretamente da torneira.
Victor conseguiu desenvolver uma vela capaz de filtrar a água com muito mais eficiência do que o processo do “filtro reto”: a vela tratava-se de um cilindro fechado, composto de uma mistura de caulim, carvão e outras substâncias, parafusada com duas arruelas de borracha a uma chapa de ferro cromada, a qual, por sua vez, era pregada com cimento entre as duas partes do filtro. O logotipo do filtro, com a inscrição “São João”, era moldado numa fôrma de gesso e depois pregado na metade de cima do filtro. O produto tinha quatro tamanhos diferentes, identificados por números. O processo de produção do filtro era essencialmente artesanal: o ceramista colocava um pedaço de argila limpa e tratada sobre um torno, e moldava com as mãos o formato do filtro.
A partir de 1940, a “Cerâmica Lamparelli” começou a passar por dificuldades. A principal causa foi o racionamento de combustível provocado pela II Guerra Mundial, o qual afetou diretamente a distribuição dos produtos da empresa, pois as entregas em domicílio e para outras cidades, feitas pelos caminhões, eram o ponto forte da estratégia de vendas da cerâmica. Ao mesmo tempo, o interesse de Victor pela condução da cerâmica reduziu-se, e a empresa passou a ser administrada pelo seu filho mais velho, Volponi Lamparelli.
A partir do Pós-guerra, com a retomada das vendas, a empresa recuperou-se. No entanto, como não havia interesse nem por parte de Victor nem por parte dos filhos em continuar administrando a cerâmica, decidiu-se pela sua venda. Assim, em 1947, a “Cerâmica Lamparelli” foi vendida, a prazo, para quatro jovens irmãos da família Stéfani. Os irmãos Stéfani deram seqüência à administração da “Lamparelli”: mantiveram na empresa os cerca de 10 funcionários e continuaram com o nome “Cerâmica Lamparelli” por mais alguns anos, somente acrescentando ao nome a expressão “Irmãos de Stéfani”. Os novos proprietários permaneceram no imóvel por mais 11 anos, até 1958, quando se transferiram para um local maior. Victor ainda continuou a fabricar e a fornecer para os Stéfani, por alguns anos, as velas para o filtro “São João”.
Referência:_Julio Cesar Bellingier. A INDÚSTRIA CERÂMICA EM SÃO PAULO E A “INVENÇÃO” DO FILTRO DE ÁGUA: UM ESTUDO SOBRE A CERÂMICA LAMPARELLI – JABOTICABAL (1920-1947). UNESP-SP,2003
Acesso:www.abphe.org.br/arquivos/2003_julio_cesar_bellingieri_a-industria-ceramica-em-sao-paulo-e-a-invencao-do-filtro-de-agua-um-estudo-sobre-a-ceramica-lamparelli_jaboticabal-1920_1947
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