terça-feira, 18 de novembro de 2025

CONTOS E CRÔNICAS DO JEQUI - O Vale não é perdido, é resistência: A cegueira do capital na COP30

Foto: IEPHA

Na imponente passarela global da COP30, onde o discurso verde deveria ecoar com a força da mudança, o que se ouviu de uma voz influente foi o velho e rançoso coro da desumanização. As declarações pejorativas da CEO da Sigma Lithium,,  classificado o povo do Vale do Jequitinhonha como "geração perdida" e "mulas de 'água", não são apenas um erro de cálculo; são um atestado de cegueira moral e histórica que o capital, travestido de sustentável, insiste em ostentar.

A escolha das palavras revela mais do que a intenção; revela a cosmovisão. Chamar uma população inteira, forjada na luta diária e na secura do semiárido, de "geração perdida" é varrer para debaixo do tapete séculos de história, de arte, de sabedoria ancestral. É ignorar a beleza natural que brota do barro transformado em cerâmica pelas mãos das mulheres e homens artesãos, cuja arte se tornou símbolo de Minas Gerais e do Brasil. É desqualificar a poesia que nasce da viola, a fé que move os mutirões e a organização social que mantém a vida digna onde o Estado há muito falhou.

E a alcunha "mulas de água"? É a tradução crua e cruel do que a lógica extrativista realmente pensa de quem vive no território: mão de obra descartável ou, pior, meros instrumentos para carregar nossos recursos. O lítio, vendido como a esperança "verde" para o mundo, tem custado a água e a paz de nosso povo e de nossas comunidades no Vale, como evidenciam as denúncias de impactos ambientais e sociais. A "mula de água" é a inversão perversa do discurso onde o social é reduzido à exploração ou ao assistencialismo de cestas básicas, cisternas, caixas de água, enquanto a autonomia e o modo de vida local são pulverizados.

O Vale do Jequitinhonha não é um vale de miséria ou de passividade. É um Vale de Resistência, as peças de barro que adornam museus e casas pelo mundo são a prova viva de uma cultura que teima em florescer. São quilombos, são festejos, são a tradição oral dos trovadores do Vale, são os saberes das quitandeiras e a força dos povos originários e o modo de vida de ser do Vale..

O povo do Jequitinhonha resiste à seca, à pobreza estrutural e, agora, resiste à nova onda de mineração que, sob o manto da "transição energética", tenta impor o progresso de cima para baixo. É uma luta por território, por água e pela dignidade de escolher o próprio futuro, e não de ser obrigado a aceitar as migalhas do boom do lítio.

A base da vida na região é o coletivo. Os mutirões, as associações , os grupos de luta por terra e água; a sobrevivência no semiárido é, por natureza uma força solidária que contrasta brutalmente com a lógica individualista e predatória do grande capital.

A audácia de proferir tais injúrias num fórum dedicado ao futuro do planeta revela a fissura entre o discurso e a prática das corporações. O progresso que destrói a vida, a cultura e a autoestima de um povo; é a repetição de um ciclo de colonização.

Que as declarações de desprezo proferidas pela Senhora Ana Cabral, CEO da Sigma Lithium, em entrevista ao programa Fast Money, do canal Times Brasil, durante a COP 30. não nos desviem do ponto central: a riqueza do Vale reside na sua resiliência inacreditável, na sua gente que, mesmo marginalizada, continua a gerar arte, afeto e vida. O Vale não é "perdido"; é o caminho, nossas criança não são “ Mulas de Água” , são a esperança de um futuro melhor, e essa gente vai dá com os  “BURROS NA ÁGUA” porque nosso povo não se curvará a empresas ou aos psuedocoroneis e pseudopolíticos que ainda existem em nossa região. O Vale do Jequitinhonha não precisa ser salvo,  o Vale precisa ser respeitado.

 

Jô Pinto, nas terras do meu querido Vale do Jequi

 

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