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Fonte: Portal Minas |
O
nome "Vale do Jequitinhonha" carrega consigo não apenas uma
referência geográfica, mas também um profundo simbolismo histórico e cultural.
Localizado no nordeste de Minas Gerais, o vale é assim chamado porque o rio
Jequitinhonha atravessa toda a sua extensão, desde sua nascente no município de
Serro até sua foz no município de Belmonte, na Bahia. O termo
"Jequitinhonha" tem origem indígena, “rio largo e cheio de peixes (IBGE)”,
mas o conhecemos como “Jequi” Armadilha Indígena e “Onhas ” Peixe ou seja
Armadilha de pegar peixes.
A
termologia “Vale do Jequitinhonha “não é uma simples designação geográfica. Ao
longo das décadas, esse nome foi apropriado por diferentes discursos, sejam políticos,
acadêmicos, midiáticos e culturais, no qual o moldaram conforme interesses
diversos. O uso do nome, portanto, não é neutro: ele revela tensões entre
identidade, estigma e resistência.
Historicamente,
o Vale do Jequitinhonha foi rotulado como uma das regiões mais pobres de Minas
Gerais e do Brasil. Essa marca, muitas vezes reforçada por políticos e seus
interesses particulares e pela mídia, cristalizou uma imagem de miséria que
obscureceu por muito tempo a riqueza cultural, ambiental e humana do
território. O nome passou a ser usado como sinônimo de carência, apagando a
complexidade e a diversidade dos municípios que o compõem.
Por
outro lado, artistas, artesãos, comunidades tradicionais e lideranças locais ressignificaram
o nome como símbolo de resistência e potência criativa. O artesanato em
cerâmica, os bordados, a música, literatura, os grupos de cultura popular e comunidades
tradicionais do Vale são expressões que desafiam o estigma e reivindicam uma
identidade própria. Nesse contexto, o uso do nome "Vale do
Jequitinhonha" torna-se um ato político: afirmar o nome é afirmar a
existência, a memória e o direito à dignidade.
É
preciso também questionar como instituições, universidades, ONGs, governos e empresas
e grandes empreendimentos utilizam o nome em projetos e pesquisas. Muitas
vezes, o nome é invocado para atrair recursos ou justificar intervenções, sem
que haja uma escuta real das comunidades envolvidas. O risco é transformar o
Vale em objeto de exploração ou vitrine de políticas, sem garantir protagonismo
aos seus habitantes.
O
uso do nome "Vale do Jequitinhonha" deve ser feito com
responsabilidade e consciência crítica. Nomear é também narrar e toda narrativa
carrega escolhas, silêncios e disputas. Cabe a nós, enquanto sociedade e
moradores desse chão, reconhecer que o Vale é mais do que um território marcado
por dificuldades: é um espaço de saberes, afetos e possibilidades que merecem
ser contados por quem vive e transforma essa realidade todos os dias.
Jô
Pinto
Historiador/Mestre
em Ciências Humanas
“O Vale do Jequitinhonha
costuma ser descrito a partir de vários elementos: a poeira, a aridez, o sol, o
calor, o rio, por exemplo, vão formando seu ambiente. Os tropeiros, canoeiros,
pescadores, artesãos, lavadeiras, romeiros são alguns de seus personagens
sempre lembrados. A junção disso tudo compõe as suas muitas narrativas,
forjadas tanto na dureza quanto na delicadeza da existência. São muitas as
contradições, próprias de qualquer ambiente humano, muitas as diferenças. Mas
tudo está lá, ao longo de um vale de muitos jequitinhonhas.
este cenário, a
arte de fazer a vida ainda é algo que se aprende e se ensina, mesmo em
contextos improváveis, como pequena flor no deserto. Por isso nos espanta essa
beleza. Esses fazeres não estão separados das pequenas (mas poderosas)
narrativas de cada pessoa. São algo tão variado quanto toda a paisagem, mas têm
em comum as sensibilidades e os desejos das gentes, as inteligências populares,
misturadas às devoções, às místicas e à vivência mágica dos seus mistérios.
Artesãos e artesãs colocam ali sua própria história, e é essa a força criativa
de um grande (hiper)texto – mãos e mente integradas.Teria este povo a vida nas
mãos?
Márcio Simeone Henriques
UFMG
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