terça-feira, 31 de janeiro de 2023

O ASSUNTO É? - Majestade o sabiá e a memória



Sabiá laranjeira - imagem internet


Outro dia, ouvindo a música “Majestade sabiá” de Jair Rodrigues, fui levada de volta ao final dos anos 1980 e início da década de 1990, quando morava na região rural de Bocaiúva, vale do Jequitinhonha. De manhã cedinho, D. Maria, minha mãe começava a se movimentar pela casa, especialmente na cozinha, acendendo o fogão a lenha e dando início aos afazeres do dia, logo o cheiro de café quente subia, porém, antes de tudo ela ligava o radinho de pilhas e ouvia o bom dia dos locutores seguido das modas de viola. Majestade sabiá, era interpretada por Roberta Miranda e Chitãozinho e Xororó. Minha mãe amava cantar, sua voz enchia os ares junto com o aroma do café, ali mesmo plantado, colhido, torrado e moído. Essa música, além de ativar memórias saudosas de minha mãe, da minha infância no campo, fala sobre o potencial da memória em nos levar outros tempos e lugares. O eu poético diz: “meu pensamento toma formas eu viajo, vou pra onde deus quiser” e “estou indo agora pra um lugar todinho meu, quero uma rede preguiçosa pra deitar, em minha volta sinfonia de pardais, cantando para a majestade o sabiá”. Tudo que narra é maravilhoso, o adentrar a floresta, o cantar dos pássaros, o descanso na rede. Porém, todo esse universo está guardado dentro de si mesmo, a partir do mecanismo de rememorar, relembrar: “ o meu eu, este tão desconhecido, que jamais serei traído, pois este mundo sou eu”. Me fascina a memória e sua capacidade de nos presentear com o que já vivemos e perdemos, como o corpo guarda um universo de lembranças que são ativadas quando ouvimos uma canção, sentimos um cheiro, experimentamos uma sensação. Nosso corpo é onde estamos no mundo, é através dele que nos situamos. Assim, toda vez que ouço Majestade sabiá, volto no tempo e revivo momentos que jamais serão esquecidos, pois fazem parte do que sou. Se atentem às formas como as memórias são ativadas, como as experiências sensoriais do presente promovem a rememoração do passado e aproveitem conscientemente desse potente recurso corpo.  


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segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

MEMÓRIA CULTURAL - Andu

 




O  nome científico deste feijão é Cajanus cajan,  originária da Ásia, mas foi trazido para o Brasil no cabelo dos escravos, dentro dos navios negreiros. O nome ‘Andu” é de origem africana, do dialeto falado no antigo Reino do Congo.

Atualmente a  Índia  é o maior produtor mundial de guandu, onde é usado para a produção de dhal, preparação caudalosa e apimentada que também é feita com ervilhas ou grão de bico.

No Brasil adaptou-se bem ao clima tropical, rico em ferro e cálcio , não é feijão de muito caldo por isso costuma ser comido como salada reforçada, com linguiça, cebolas, pimenta e coentro, ou então como farofa ou até em omelete.

Na região do Vale do Jequitinhonha , conhecemos o “Andú”, uma espécie de legumilosa arbustiva que produz vagens com sementes arredondadas com cores variadas  de verde-marrom ou púrpura. É um arbusto com raiz finas e atingem aproximadamente 3 metros de profundidade. A semente ficam nas vagens e podem ser encontradas de 2 a 9 grãos por vagens. É uma planta rústica e tolerante a secas e solos inférteis, apresenta um grande potencial para alimentação humana e animal.

O feijão guandu não é tão suscetível a doenças e pragas, como outras espécies que encontramos na agricultura.O guandu perfura as camadas mais compactadas do solo, permitindo que ele receba mais ar e água, e ainda cobre o solo com as folhas que caem dele. Assim que dá flores, as abelhas as visitam, colhendo o néctar para preparar o mel. As folhas verdes dá  para fazer um chá que atua como depurativo do sangue. As vagens, também verdes, podem ser colhidas para se comer os grãozinhos como ervilhas brilhantes. E das  vagens secas, separa-se  os grãos e prepara-se deliciosas e nutritivas paneladas de alimento. Os grão secos também podem ser torrados no forno. Quando começam a liberar o cheirinho de grão torrado, podem moer bem fininhos, ou pilados,  e preparados no coador, como uma bebida quente igual ao preparo do café, que não há um uso frequente em Minas Gerais.

É fonte de fibras, proteínas e vitaminas importantes, o andu é rico em diversos sais minerais: cálcio, fósforo, potássio, magnésio, ferro e zinco. Por conta disso, ele é fundamental para a saúde dos ossos, músculos, do cérebro e ajuda a manter o sistema circulatório em bom funcionamento.

Ótimo para prevenir anemia  e garantir um bom funcionamento das células - levando em conta que o mineral é responsável pelo transporte de oxigênio na corrente sanguínea. Grande aliado para a saúde da visão - ajuda a prevenir degeneração macular e problemas na córnea, por exemplo. Além disso, essa vitamina fortalece a imunidade, combate o envelhecimento precoce e faz bem para os sistemas nervoso e cardiovascular.

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sábado, 14 de janeiro de 2023

GIRO PELO VALE - Morre Frei Chico e o Vale do Jequi fica de luto

Foto: Omar Abrão

Franciscus Henricus van der Poel l (Frei Chico), nascido em Zoeterwoude na Holanda, no dia 03/08/1940. Membro da Ordem dos Frades Menores desde 1960, Chega ao Brasil em 17/11/1967, Tornando-se  (sacerdote católico) franciscano da Província da Santa Cruz (PSC), com sede em Belo Horizonte MG..

Chega no Vale do Jequitinhonha em 1968 para a Diocese de Araçuaí. Em 1969, assume a Paróquia de Santo Antonio em Itinga, substituindo o na época ainda padre Enzo, mesmo ficando em Araçuaí em Itinga, foi responsável pela paróquia de Itinga até 1977. Assim escreveu Frei Chico no livro de registro da paróquia  Santo Antonio de Itinga em 1976.

 

“ Foi durante uma semana santa em Itinga que cresceu meu amor pela religiosidade popular, cujo estudo hoje ocupa mais da metade do meu tempo. Como é  admirável a fé de nosso povo rural e como é rica sua expressão . Aqui vemos como nosso povo do Vale do Jequitinhonha se identifica com o Cristo que sofreu”

 

Pesquisador da cultura popular, durante os 10 anos que morou no Vale do Jequitinhonha, na diocese de Araçuaí MG., anotou  parte da cultura popular em 15 mil folhas e gravando 250 fitas K7. diz  Frei Chico  -  “Nesta empreitada, fui ajudado pela artesã Maria Lira Marques. Percebemos que da rica cultura dos pobres registramos apenas uma pequena parte. Em 1970 fundei o coral Trovadores do Vale no qual pessoas pobres do Vale cantam músicas da sua própria cultura. O repertório deste coral é um dos frutos da pesquisa realizada”.

A partir de 1978, Frei Chico vai  morar em  Betim MG, e no qual foi  liberado para a pesquisar a promoção da cultura popular, como ele mesmo dizia:  “Dediquei-me especialmente às culturas religiosas existentes no Brasil. Tive correspondência com Luís da Câmara Cascudo, com Mário de Souto Maior e alguns outros grandes folcloristas. Os antropólogos Carlos Rodrigues Brandão, Lélia Coelho Frota ajudaram-me a situar minhas pesquisas conjunto mais amplo da cultura nacional. Frequentei terreiros, santuários de romaria. Participei de muitas festas, entrevistei lideranças populares.  Durante 16 anos morei na Colônia de Santa Isabel (Betim), onde escrevi a maior parte do Dicionário da Religiosidade Popular. Lá também era regente do coral de hansenianos curados e outros em tratamento. Quem não convive com pobres e marginalizados, não tem o direito de falar em nome deles. Nas comunidades populares observa-se a não separação entre vida e religião. Fiz conferências em muitas universidades, participei de congressos, acompanho movimentos populares. Tenho muitos artigos publicados em revistas especializadas. Possuo também um extenso currículo artístico musical, com apresentações em praças e ruas, teatros, rádio e TV”.

Autor de diversos livros  obre cultura e religiosidade popular, por exemplo o mais recente,  Dicionário da Religiosidade Popular, 2013, 1150 p. Membro da Comissão Mineira de Folclore (1981), do Instituto Histórico e Geográfico de MG (1990). Conselheiro do Centro da Memória da Medicina da UFMG, docente no Instituto C. G. Jung de MG e palestrante na Secretaria Municipal do Meio Ambiente (BH). Músico da OMB, palhaço do “Pano de Roda” (BH). Presença em movimentos populares (folias, congados e terreiros afro-brasileiros), no meio artístico (música e teatro) e na mídia. Conferências em muitas universidades e congressos. Frei Chico também participou da edição do livro "Um olhar sobre o Congado das Minas Gerais, de autoria da Professora da UEMG, Cris Nery, escrevendo o texto "Congado: origens e identidade".

 

Hoje 14 de janeiro de 2023, Frei Chico deixe esse plano terreno, para viver a plenitude da vida espiritual,  religioso, pesquisador, defensor da cultura  e religiosidade popular, de modo especial a do Vale do Jequitinhonha. 

Nos filhos do Jequitinhonha perdemos alguém que apesar de ter nascido  tão longe, escolheu nosso pais e nosso  Vale do Jequitinhonha como seu lar. Seu corpo descansará no cemitério da Irmandade do Rosário dos Homens Pretos de Araçuaí , seu espírito será guiado por Nossa Senhora do Rosário  ao encontro do pai para sua morada eterna.

A nos fica o legado do amigo, do pesquisador e do  Frei Franciscano que dedicou sua vida em registrar , respeitar e divulgar para todo a nossa religiosidade e cultura popular .

A família e amigos pedimos ao pai o conforto necessário....

Vai na luz Frei Chico e muito obrigado por tudo.

 

Jô Pinto,

Iitnga/MG, em um dia triste de Janeiro de 2023.

 

 Pesquisa

 www.religiosidadepopular.uaivip.com.br

PINTO. José Claudionor dos Santos. Memórias de Itinga,  Centro Cultural Escrava Feliciana. 2009

currículo: http: lattes.cnpq.br/8705942860002739. 

 


MEMÓRIA CULTURAL - UM CASO DE AMOR NA ROTA BAHIA-MINAS

  Imagem: Internet   Seu maquinista! Diga lá, O que é que tem nesse lugar (...) Todo mundo é passageiro, Bota fogo seu foguista ...