Criança comunidade Quilombola Córrego Narcisio/Araçuaí-MG |
“Pra entender o erê, tem que tá moleque”. O que essa frase
diz? À primeira vista, parece apenas um trecho de uma canção, porém, traz
profunda reflexão. Primeiro, é importante saber que Erê[1],
na música, é entendido como a criança.
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Há uma radical alteridade entre o mundo adulto e o infantil.
A infância é uma dimensão da vida totalmente diverso da fase adulta. Para
buscar compreender esse universo é preciso se colocar à altura da criança,
exercitar a empatia, buscar relembrar a criança que você foi. Há uma tradição
consolidada de se educar os pequenos com agressividade, com surras, violência
psicológica, brutalidade. São práticas tão arraigadas que quando as
questionamos somos repelidas/os com veemência. Dizem que a verdadeira educação
se faz dessa forma. Será? A infância é um período da vida que necessita do
amparo e cuidado. Os pequenos são frágeis fisicamente em relação aos já
crescidos. Assim, é absurdo e desproporcional que um adulto bata numa criança.
Deveria ser algo digno de vergonha. As
crianças não aprendem a serem boas pessoas com safanões, com beliscões e com pancadas,
como é comumente defendido por muitos/as. Dados de pesquisa da Sociedade
Brasileira de Pediatria mostram que cerca de 2.083 crianças foram mortas por
agressão no Brasil entre 2010 e 2020, sendo que 80% desses ataques partiram de
pais, mães ou outros/as “responsáveis”. A agressão e violência sofridas na
infância, quando não mata o corpo, mata a alma. Tanto abuso repercute negativamente
na idade adulta, sendo responsável por formar pessoas inseguras, com baixa
autoestima, fragilizadas e até mesmo reprodutoras de violência. Muitos
reproduzem tal padrão de “educação” sem refletir sobre seus efeitos nocivos. Respeito
não se conquista através da imposição do medo. Será que queremos as futuras
gerações com autonomia para protestar contra as injustiças ou apenas pessoas
atemorizadas que obedecem a ordens sem questionamento? Acredito que para além
do dever de respeitar e amar as crianças, devemos aprender com elas a paixão
pela descoberta, a olhar o mundo com encantamento, nos colocarmos à sua altura
e observar o chão, as pequenas pedras, as labutas das formigas. Ao
experimentar olhar a partir do chão
para o alto, a perspectiva muda, o olhar é ampliado. Da mesma forma, precisamos
lançar o olhar sobre nossas certezas limitadas sobre educação e tantas outras
questões.
[1] O Erê, no Candomblé, é a energia do Orixá, em Iorubá significa brincar, por isso é associado aos Ibêjis, que são as crianças. Fonte: Fernando D’Osogiyan
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